De início o Auto-tune parecia uma ferramenta simpática, que permitia corrigir pequenos erros na gravação de músicas, útil especialmente para álbuns de apresentação ao vivo. Logo descobriram que com a ferramenta podem fazer qualquer um cantar, e vocais absurdamente distorcidos são praxe no pop atual - que o digam Justin Bieber, Britney Spears, e (não clique nesse link) Rebecca Black.
E quando eu digo qualquer um, é qualquer um mesmo. A banda The Gregory Brothers é responsável pelo Auto-tune the news, onde criam músicas usando propagandas e notícias, fazendo vídeos hilários. Em 2010 eles ficaram famosos com Bed Intruder, o vídeo mais assistido do ano no Youtube!
Querendo entrar na brincadeira, o produtor John Boswell garimpou sua coleção de Cosmos em busca das passagens mais inspiradoras ditas por Carl Sagan[1], mesclou tudo em um vídeo e fez Carl cantar, com participação especial de Stephen Hawking. Há alguma ironia em remixar uma voz robótica, mas não consigo encontrar...
A recepção é muito variada: tem quem ria nos primeiros segundos; tem quem não suporte sua voz de Kermit the Frog; tem quem não suporte música eletrônica, ponto; e tem aqueles que, como eu, de início se mostraram reticentes e no segundo refrão já estavam cantando junto. Ouvi essa música sem parar por uma semana, e ainda não estou cansado. Bom, assista e tenha sua opinião.
"A still more glorious dawn awaits
Not a sunrise, but a galaxy rise
A morning filled with 400 billion suns
The rising of the Milky Way"
Lembro que nas primeiras semanas A Glorious Dawn ganhou a menção honrosa de vídeo mais bem avaliado do site. Até o momento, para cada pessoa que não gosta há 85 que gostam. Não achei nenhuma referência que comprove isso, talvez eu esteja confundindo com Where the hell is Matt?, mas confie em minha memória.
Ainda estou tentando entender porque o vídeo e a música tiveram um impacto tão profundo em mim. Para os impressionáveis como eu, a letra do refrão é de tirar o fôlego - imagine, ver a Via Láctea como alvorecer! Também, a música preenche um nicho onde não existe nada parecido, uma espécie de música gospel científica, a celebração da maravilha natural do mundo. Ao mesmo tempo, há uma pitada de humor (peraí, Stephen Hawking cantando!) que impede de levar a ideia muito a sério. Por fim, a melodia é muito muito boa.
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Depois do sucesso do primeiro vídeo, John Boswell instituiu o projeto Symphony of Science [2], e vem lançando novas músicas com alguma regularidade, garimpando frases de entrevistas, programas e palestras de vários cientistas. Até o momento são 10 vídeos, e no álbum há uma faixa bônus. Você pode adquiri-lo aqui, pagando o quanto quiser, inclusive zero [3].
Exceto pela primeira música, cada uma das seguintes aborda um tema. Minhas preferidas são The Unbroken Thread (vida e evolução), The Case for Mars (exploração de Marte), A Wave of Reason (pensamento cético) e Ode to the Brain (cérebro, duh!)[4]. A qualidade varia, embora não há nenhuma que eu ache ruim - The Poetry of Reality e The Big Beginning são um pouco fraquinhas. O compositor tem alguns vícios (estrofes como verso A/verso B/verso A/verso C), mas o trabalho envolvido e a qualidade da música e vídeo compensam.
Por fim, outro dos meus favoritos (meh, quase todos são), Our Place in The Cosmos.
"Matter flowwws from place to place
And momentarily comes together to be you
Some people find that thought disturbing
I find the reality thrilling"
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[1] O astrônomo Carl Sagan foi (e é) um divulgador de ciência que inspirou uma geração inteira nos anos 80 e 90, com a série de televisão Cosmos e alguns best-sellers. Se realmente não o conhecia, talvez essa seja uma boa oportunidade :)
[2] Músicos de eletrônica têm hábito de fazer bandas-de-um-homem-só ou no máximo duos.
[3] Eu paguei US$ 10, e foi a primeira vez que comprei música na internet.
[4] Assista a palestra de Jill Taylor no TED, onde ela conta como foi sua experiência de derrame. "And then it explodes into this enormous collage/And in this moment we are perfect/We are whole and we are beautiful"